Faz um friozinho delicioso. É domingo. A rua está silenciosa, poucos veículos dão sinal, nenhum transeunte.
A paisagem quieta, quase imóvel; o sol escondido detrás do céu nublado que, se não me angustia, lembra-me a tristeza de uma falta.
Ouço o canto dos pássaros e o sino da Catedral alcança meus ouvidos, embora não me traga Deus. Abri todas as janelas, o vento invade o apartamento, balança as cortinas e estou só.
Vou até a cozinha, preparo um café, a bebida de minhas doces lembranças. Meu avô entregando-me uma xícara quente; em torno da garrafa, a família reunida na calçada da casa de minha avó, aquecendo-se de goles, falas e risadas.
Lembro-me dos últimos dias gélidos que vivi em Brasília. Tudo parecia estar morto, menos eu. Parei na Kopenhagen, pedi um chocolate para esquentar a boca e o corpo enquanto lia “Viver apaixonadamente com Soren Kierkegaard”, cuja mensagem contrastava fatalmente com os sentimentos que lia nos rostos dos que passavam.
Na ausência do único abraço que desejava, da única voz que ansiava ouvir, a vida não estava desprovida de encantos. Mas um nó atravessava minha garganta, um choro contido há séculos prestes a rebentar, e o gosto do fracasso que o chocolate não adoçava. Tudo ruía.
De repente, o que fizera parecia ter sido em vão. E quem amara a maior de todas as ilusões.
Em casa me perguntava o que fazia naquele lugar, que queria ao insistir na secura da terra e das gentes. Partiria em fuga do que era, do que sentia e de por quem sofria.
Hoje não sou menos, nem sinto ou sofro menos que naquele dia desértico do meu desespero. O que tenho não é mais do que tive.
Estou só – só com essa grandeza que não serve a nada.