Era uma vez ela, que – na verdade – é eu. Como explicar que não sabe enganar a si mesma e, em vez de mentir sobre o que quer, prefere se dizer a verdade?
Não gostaria de estar numa varanda sentindo a brisa gelada em sua pele e ouvindo o balançar das folhas da árvore. A árvore que se mantém em pé e sozinha durante todo o tempo, no sol ou na chuva, como para lembrá-lhe que é preciso se sustentar nas próprias raízes longas e profundas.
Que tenho a ver com a árvore?
O que ela sente é a angústia de uma saudade que só passaria depois que encostasse a cabeça no peito do homem e dormisse. Não em paz, pois ele nunca lhe dera a calma necessária para mergulhar tranquila no escuro. Mas dormiria encostada no peito e ele a abraçaria como quando criança era envolvida pelos braços do pai.
Olhava para os lados, mas não havia ninguém, e se existisse pessoa, que faria? Daria as costas para provar que é capaz de ultrapassar dores sozinha, sem o auxilio de quem jamais a entenderia. Porque os outros nada sabem de nós. E nós também pouco sabemos.
Ela – não queria casamento nem filhos; almejava morar num hotel – alcançou a plenitude ao realizar todos os desejos e fantasias? Mal sabia que a realização joga uma pessoa no mais completo vazio. Ela, que sempre quisera ter um homem, mas não o tem como gostaria. Ela, que quis ser livre desde quando abriu os olhos pela primeira vez e se tornou tão livre que chega a se perguntar: então querer é poder?
Com que cara se dirigir a Deus para lhe pedir alguma coisa se tudo que pediu teve e, nem sempre, o que teve mostrou-se bom? Pediu, recebeu, doeu. Depois, chorando, admitiu: “Não aguento mais”.
Não quero mais correr o risco de pedir e ter. Que Deus faça conforme achar que deve, pois estou muda diante Dele que tanto deu. Quer me mostrar que a vida nada tem a ver com o que tive até agora?
Estou cansada de saber coisas, de ver e de sentir tudo e tanto. E só o peito quente do homem serviria nessa hora. Mas não posso continuar pedindo cegamente. É capaz de eu ter e depois não aguentar todos os outros dias em que o homem se nega. Não quero pagar um momento de alegria com contínuos dias de dor.
Parece que ninguém sai dessa vida impunemente. Paga-se por tudo. E quanto mais se dá mais se exige. O preço foi tão alto que até agora estou sem palavras. Reduzida à inteira quietude perante os homens e ao absoluto silêncio de Deus.